terça-feira, janeiro 12, 2010

Metalinguagem

O sol forte em vão tentava tirá-lo dessa clausura voluntária. O vento soprava "Saia!" por entre as frestas desse quarto. E parecia alheio a tudo o que o cercava. Tudo exceto uma folha branca poeticamente posicionada no centro do cômodo. E a alvura da folha era incômoda e, ao mesmo tempo, fascinante.
Um simples papel em branco. Uma folha limpa de idéias, pensamentos, palavras. E havia algo dentro dele - certa inquietude crescente - que o impelia a manchar essa tão imaculada presença. Tanto havia que poderia ser escrito! E começou a escrever. Escrever tudo. E cada palavra era escrita com seu próprio sangue. E tudo era trasferido para a folha: Suor, sorrisos, lágrimas, seu corpo e sua alma. Pouco tempo depois e já era ele também a folha. E não há como explicar ele todo caber em tão pequenas dimensões, mas qualquer um que visse aquele pedaço de papel veria ele por completo.
Isso o assustava. Percebera que escrever tornara-o extremamente vulnerável. Cada pensamento, cada batida de seu coração poderiam ser percebidos por quem quer que tomasse o papel nas mãos. Não poderia suportar a idéia de alguém chegar-lhe tanto ao íntimo. Precisava desfazer-se da folha. Rasgá-la, Queimá-la ou o que fosse preciso para proteger-se. Seria, entretanto, como amputar um membro sadio. Não teria coragem para fazê-lo.
Começara a se arrepender de ter cedido ao impulso de arrancar da folha aquela pureza insuportável. Escrever fora extremamente prazeroso mas, agora, o que fazer com o que foi escrito? Um turbilhão de pensamentos tomaram conta dele. E esses pensamentos sopravam-lhe idéias. Percebera, então, que escrever não fora um problema. E mais: não se importava que o julgassem após enxergarem-no tão profundamente.
Entregou-se à folha. A folha entregou-se a ele. Consumaram o casamento e, alguns meses depois, nasceu um blog.

4 comentários:

  1. UAU!!!
    Muito bom, Leandro! E, por mais falso que eu seja, falo isso com sinceridade!
    Nossa,PERFEITO!

    Um abraço
    =D

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  2. nossa leandro, ficou MUITO bom!!!!
    morri de rir no final, completamente inesperado.
    estava com saudades do seus textos.
    Gostei muito, de verdade.
    continue se escrevendo cada vez mais
    bjosss

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  3. hahahha..Fantástico e divertido! Não precisa de mais nada.

    Parabéns

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