sábado, fevereiro 05, 2011

Golem

Estátua grotesca feita de pedra. A que se assemelha horrenda figura? Áspero. Frio. Como ganhara vida? Vaga pelo mundo. Não sabe o que procura. Não entende o que encontra. Então por que motivo vaga? Que força é essa capaz de levantar toneladas de pedras e pô-las como um andarilho sem rumo? Que poder vital move esse muro, essa montanha?

Vaga sozinho. Por que razão seria diferente? Jamais encontrara criatura disforme que lhe fosse semelhante. Por onde passa é o pavor alheio que lhe dá as boas vindas. Correm ou enfrentam-no. E que outro instinto se tem ao ver horrorosa aparição? Supõem-no monstruoso tanto quanto aparenta.

Está sentado agora. Longe de tudo. Os objetos que nele lançam são incapazes de riscar a dura pedra. Invencível. Invulnerável. E, ainda assim, são copiosas as lágrimas que os olhos de pedra vertem. Tal qual fina nascente que brota das rochas, delicadas linhas d'água percorrem a grotescamente humana face. É feito de pedra por dentro tanto quanto a superfície. Pedra e essa energia que o move. Como pode então sofrer essa criatura dos males que é incapaz de compreender? Como pode sentir sendo pedra?

Seria uma criança? Assustado com o mundo novo. Sozinho pela primeira vez. Perdeu-se dos pais e não encontra o caminho de volta. De quem partiu a crueldade de soprar vida à essa criança sem dizer-lhe o que esperar dela? Sem ensinar-lhe a falar as coisas que o gritam por onde ele passa. Sem explicar-lhe que é um golem, e que deve viver com um golem e procurar a felicidade de um golem. Ou seria ele o fim da existência de um golem? Um velho que recolheu as forças que lhe restavam para encontrar, em algum lugar do mundo, o local para seu derradeiro descanso.

Continua vagando. Já vê de longe um vilarejo. À frente deste está uma pedra e, no topo da pedra, observa-se uma figura. Reconhece seu criador. Pai, tenta falar o golem. mas não possui o dom da fala. Aproxima-se da pedra. Ajoelha-se para ficar à altura de seu mestre. Uma sensação estranha toma conta do golem. Totalmente oposta àquela que lhe fez jorrar água. Finalmente saberá tudo o que um golem precisa saber. Alguém para ensinar o que um golem busca.

Com um movimento, o criador retira o encanto. Desce da pedra e segue para o vilarejo.

Estátua grotesca feita de pedra. Áspero. Frio. Não há mais vida capaz de movê-lo. Não mais vagará. Invencível. Invulnerável. Imóvel. E, ainda assim, vertem lágrimas os olhos de pedra. E para sempre jorrará a nascente. Para sempre beberá o vilarejo do sofrimento do gigante imóvel. E não saberão sua dor de carregar, para sempre, no fronte, a faca de Medéia.

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